07 fevereiro, 2008
Verdades Provisórias
02 setembro, 2007
Voyagers 1 e 2: 30 anos viajando no espaço
Hoje a Voyager 2 está a 12,5 bilhões de quilômetros e a Voyager 1 a 15,5 bilhões de distância do Sol, numa região que marca a fronteira entre o Sistema Solar e o espaço interestelar. Ambas espaçonaves carregam instrumentos científicos que permitem estudar o vento solar, campos magnéticos e ondas de rádio enquanto cruzam por uma região do universo onde nenhum ser humano ou espaçonave jamais esteve.
As naves Voyager estão longe demais para usar energia solar. Elas consomem o equivalente a uma lâmpada de 300 watts e retiram sua energia de geradores termoelétricos de radioisótopos, uma espécie de bateria de longa duração. As Voyager estão tão longe da Terra que os comandos enviados pela NASA, mesmo viajando à velocidade da luz, demoram 14 horas para chegar até a Voyager 1 e 12 horas para alcançar a Voyager 2.
Ambas espaçonaves transportam uma cápsula do tempo com saudações, imagens e sons da Terra, incluindo orientações sobre como chegar ao nosso planeta, caso sejam recuperadas por alguma civilização extraterrestre. Por enquanto, elas seguem solitárias, na imensidão do espaço sideral. Um dia, daqui a alguns bilhões de anos, quando o Sistema Solar se desfizer, naves como as Voyager 1 e 2 provavelmente sejam os únicos registros de que houve um lugar chamado Terra e uma civilização humana. E eu fico me perguntando se haverá alguém que lerá as mensagens que lançamos em nosso infinito oceano-universo...
Maiores informações a respeito podem ser conferidas no site da NASA.
29 julho, 2007
Cabo Verde
Como podemos saber se não nos damos conta nem das vidas das pessoas que moram nos bairros e vilas ao nosso redor?
Depois de alguns anos, viajo para uma cidade próxima e sigo por uma estrada pela qual não andava há muitos anos, uma rodovia que corta os subúrbios de várias cidades da região metropolitana. Quase não acredito no que vejo. Onde antes havia campos e fazendas, agora há casas e mais casas, ruas e mais ruas, que se estendem para além de onde a vista alcança. Por alguns segundos, percebo um mundo que é muito maior do que minha mente e meu coração. Ali não há apenas casas e ruas: são milhares de consciências, com seus desejos, sonhos, temores e lembranças, milhares de pessoas que eu e tu solenemente ignoramos e para as quais igualmente não existimos. Elas vivem, como eu e tu. Elas existem.
Cabo Verde está tão longe... Quinhentos quilômetros separam o arquipélago da costa da África. A África estão tão longe... As 18 ilhas de Cabo Verde parecem perdidas no meio de um Atlântico que nos é puro desconhecimento. Fogo, Maio e Sal são os breves nomes de algumas das ilhas onde habitam cerca de 420 mil almas. Que sabemos deles?
Neste exato momento, fim de noite de domingo aqui, a madrugada de segunda flui lentamente sobre as áridas ilhas de Cabo Verde. Na imensidão da noite, na imensidão do Atlântico, Cabo Verde parece um sonho, um exercício de imaginação. Mas para a criança que acorda neste instante para tomar um copo d'água em Assomada, um pequeno povoado no interior da ilha de Santiago, nada é mais real que seu copo, sua casa, sua família, sua pobreza talvez, sua ilha. Para essa criança, eu e tu não existimos. Estamos muito além de sua consciência e de seu coração. Para bilhões de pessoas deste planeta, eu e tu não passamos de ilhas longínquas, quase imaginárias, perdidas no oceano da vida. Somos Cabo Verde.
06 abril, 2007
Soma FM: uma rádio
É difícil encontrar, em lojas brasileiras, algum CD dos grupos que tocam nessa emissora: há desde neo-zelandezes (como o grupo Patio), italianos como The Dining Rooms até alemães como Ulrich Schnauss ou Barbara Morgenstern. Vale a pena também citar The Gentle People, Neotropic, Afterlife, Millenia Nova, Leggobeast, Lemongrass, Jens Buchert, Blackfish, The Verbrilli Sound, AKMusique e Marconi Union.
Há tanta coisa detestável no mundo real e no mundo digital neste início de milênio, mas poder escutar em São Leopoldo uma rádio assim, com som perfeito, embora ela se localize num subúrbio de San Francisco, na California, é uma das vantagens de se viver no século XXI.
18 março, 2007
O Sul
De um dos pátios ter olhado
as antigas estrelas,
do banco da
sombra ter olhado
essas luzes dispersas
que minha ignorância não aprendeu a nomear
nem a ordenar em constelações,
ter sentido o círculo da água
na secreta cisterna,
o odor do jasmim e da madressilva,
o silêncio do pássaro adormecido,
o arco do saguão, a umidade
- essas coisas são, talvez, o poema.
Poema colhido no livro Fervor de Buenos Aires, originalmente publicado em 1923.
20 fevereiro, 2007
Sobre a felicidade
Ele cita dois psicólogos (David Myers e Ed Diener) que fizeram ampla pesquisa sobre a sensação de felicidade entre norte-americanos ao longo das últimas décadas:
E Myers e Diener observam: "Em comparação com 1957, os americanos possuem duas vezes mais carros por pessoa - além de fornos de microondas, televisores coloridos, videocassetes, aparelhos de ar condicionado, secretárias eletrônicas e 12 bilhões de dólares de tênis de marca novos por ano. Então, os americanos esstão mais felizes do que em 1957? Não estão."
Em um país industrializado, o dinheiro compra apenas um pouco da felicidade: a correlação entre riqueza e satisfação é positiva, porém pequena. Ganhadores de loteria, depois de passar a comoção da felicidade, retornam a seu estado emocional anterior. Do ângulo mais positivo, isso também acontece com pessoas que sofreram perdas terríveis, como paraplégicos e sobreviventes do Holocausto.
(...) O estudo da felicidade muitas vezes lembra um sermão pregando valores tradicionais. Os números demonstram que os felizes não são os ricos, privilegiados, saudáveis ou bem-apessoados; são os que têm cônjuge, amigos, religião e um trabalho instigante e significativo. Essas constatações podem ser exageradas, pois aplicam-se a médias, não a indivíduos, e porque é difícil desenredar causas e efeitos: ser casado pode fazer você feliz, mas ser feliz pode ajudá-lo a casar-se e manter-se casado. Mas Campbell (um pioneiro da psicologia evolucionista) fez eco a milênios de homens e mulheres sábios quando resumiu o resultado de sua pesquisa: "A busca direta da felicidade é uma receita para uma vida infeliz."
Penso no que dizem Pinker e Campbell e me despeço com uma pergunta: se eles têm razão, será que muitos de nós não teríamos de mudar o rumo de nossas vidas?
Até a próxima.
09 fevereiro, 2007
Pedaços
Nossos sentidos percebem continuidade. Nossa mente sente-se permanente: sou, essencialmente, o mesmo de um ano, de vinte anos atrás. É da percepção dessa continuidade que se forma nossa sensação de identidade. A vida não pode ser descontínua, pensamos. Meu pensar, meu sentir não podem ser fragmentados, pois, se assim fosse, quem seria eu, quem seríamos nós? Fragmentos que têm uma ilusão de unidade?
Mas é preciso considerar que a verdade segue seu próprio caminho, e não as auto-estradas que preparamos para ela. O fato de que nós sentimos e desejamos uma continuidade não significa que ela exista.
Nossa percepção de cores e sons é limitada pelos nossos sentidos: há cores e sons que nos escapam. A realidade, para cada um de nós, é moldada pelos nossos sentidos e nossos pensamentos. Nossa mente está programada para enxergar continuidade: não fosse assim, como conseguiríamos atravessar a rua ou dirigir um carro? Nós somos tempo: relógios que pensam. Consciência é tempo, tempo é continuidade.
Tentemos deixar momentaneamente nossas mentes de lado. É impossível, mas vamos fazer de conta. Tentemos enxergar o mundo sem nossos pensamentos e desejos... Talvez vislumbremos a possibilidade – “absurda, sem sentido”, diríamos todos nós em coro – de que cada instante é ele próprio, sem nenhum fio que o ligue ao instante anterior e ao próximo...
Sob essa perspectiva, que deixarás de lado tão logo termine de ler este texto, cada instante da minha e da tua vida é completo em si mesmo, não um pedaço que se liga a outros. Instantes soltos, que nascem e morrem antes de serem sentidos. A vida: uma fonte de instantes, brotando incessantemente – o paradoxo da contínua descontinuidade. Se for assim, cada um de nós é, sem saber, o narrador de sua própria vida, tentando incessantemente conectar um instante no outro, costurando-os com o fio de nossas esperanças e crenças. O grande (e inconsciente) propósito de nossas vidas seria, então, o de buscar continuamente que a junção desses fragmentos componha uma narrativa, dando às nossas existências um sentido de que precisamos ardentemente mas que não existe fora de nós.
12 agosto, 2006
Garota ateniense
Essa garota existiu. Seus pais, seus irmãos, seus tios, filhos, netos também existiram. Mas, vê só, tu nada sabes dela, ninguém nada sabe dela ou de sua família. Onde está seu túmulo? Onde está uma referência a ela num livro de história clássica? Nada sobrou de sua existência que tenha chegado à nossa consciência. É verdade que parte de suas cinzas se transformaram mais tarde em videiras, que se transformaram em uva, em vinho, que foi bebido por outra garota, que deu a luz a mais uma moça, num ciclo sem fim. É verdade que o que ela disse ou fez influenciou o pensamento ou o destino de muitas pessoas que com ela conviviam. Mas também é verdade que sua vida se perdeu na história, os rastros de sua existência foram se apagando ao passar de cada segundo, de cada minuto, sob o peso das ações e pensamentos de bilhões de seres humanos que nasceram e morreram depois dela.
Tu me perguntas o que tens a ver com essa menina. E eu te digo que talvez, daqui 2500 anos, tu sejas a garota ou o garoto cuja existência não passe de uma hipótese no raciocínio de gente especulando sobre a passagem do tempo. Pensando bem, não será toda a humanidade, daqui milhões ou bilhões de anos, também uma garota ateniense na história do universo?
05 agosto, 2006
Sem nós
Uma árvore projeta sua sombra sobre um gramado ao sol do meio-dia, mas ninguém está lá para ver nem árvore nem sombra. E no entanto elas existem tão concretamente como a cadeira em que tu te sentas agora. O vento acaricia as folhas da árvore solitária, mas não há ninguém para escutar o doce murmúrio desse suave contato. Não há idéia de árvore. Há apenas árvore. Não há sensação de vento. Apenas vento.
Também não há vitória ou derrota, ambição ou humildade, desejo ou resistência. Há apenas vida, sem mim, sem ti. Vida sem nós.
11 junho, 2006
Mais uma segunda?
E se me perguntas qual o sentido de tudo isso, é claro que eu não consigo encontrar resposta - o que não significa afirmar a ausência de sentido. Tenho comigo, porém, um pouco de talvez: sim, talvez não devamos ficar buscando o sentido da vida, mas atribuir um sentido às nossas vidas.
Nesse meio tempo, a noite que caía tomou conta de tudo. As nuvens se dissiparam, e a escuridão de um espaço pontilhado de estrelas é o manto que cobre nossas inquietações e esperanças.
27 maio, 2006
Lugares e momentos
Lugares e momentos para se contemplar:
- A madrugada ensolarada de final de junho em Tromso, na Noruega.
- As pessoas e as casas num meio de tarde em Antananarivo, capital de Madagascar.
- Um eclipse total de sol, como o que eu vivi em Santa Catarina, em novembro de 1994.
- O silêncio e a imensidão dos Andes, a 3200 metros de altura, perto de Santiago do Chile.
- Uma chuva de meteoros riscando o escuro céu de um recanto afastado, em Lomba Grande.
- O Monte Wellington impondo sua presença sobre Hobart, a capital da Tasmânia.
- Um cometa com majestosa cauda, visível a olho nu, mesmo numa grande cidade, como o Halley de 1910.
- O tradicional nevoeiro se dissipando na manhã de Walvis Bay, na costa da Namíbia.
- A pacata vida matinal de Vélez Rubio, perdida entre Granada e Alicante, na Espanha.
- O suave vento que percorre o deserto vermelho das planícies marcianas.
02 abril, 2006
Um pouco de poesia e mistério
17 março, 2006
Saber o futuro
O que pensas do futuro? Ele te preocupa? Queiras ou não, tens em ti a consciência humana, que nos faz ver para além ou para aquém do agora. Graças a ela, o presente momento quase nunca é inteiro: parte da nossa mente está sempre enredada nas teias do passado ou tateando as incertezas do futuro.
Por uns momentos, deixemos o passado um pouco de lado, fiquemos apenas com o futuro. Mantemos com ele uma relação ambivalente: frente a um agora sombrio, a esperança no futuro nos consola; porém, o receio do que poderá acontecer amanhã pode nublar o céu azul que nos cobre neste momento. Alguns são menos sensíveis às incertezas da vida, mas muitos de nós - e talvez tu estejas entre eles - se preocupam por não saberem como serão os próximos dez anos ou mesmo como será o dia de amanhã.
As preocupações são criativas e vivem de mãos dadas com a imaginação. Talvez já tenhas pensado em como seria bom saber o que vem lá à frente. Não digo cogitar, digo saber: ter a certeza. Se vieste comigo até aqui, avancemos um pouco mais: imagina que soubesses tudo a priori: cada segundo de tua vida futura conhecido da mesma forma como todos os segundos já vividos por ti. Seria uma vida sem prazeres inesperados, mas também sem frustrações. Ela estaria toda em tua mente, como uma biografia que lemos e relemos até sabermos de cor. Mas, pense bem, antes de sonhar em ter todo esse poder... O futuro apareceria para ti como uma montanha de pedra, imóvel, surdo a todos os apelos para que fosse diferente. O presente continuaria impuro, pois o amanhã estaria sempre em tua mente, não como cogitação, mas como certeza.
Ser humano, ou seja, ter consciência, é a grande tragédia, mas também o grande desafio de cada um de nós. Eis aí a grandeza da humanidade, condenada a poder conceber as mais engenhosas utopias e ao mesmo tempo obrigada a conviver inexoravelmente com os limites do agora e as dúvidas acerca do amanhã.
É por isso que eu te digo: é melhor ser simplesmente humano e viver a beleza de tentar moldar o futuro, de consegui-lo algumas vezes, de se decepcionar outras tantas. Fazendo isso, talvez possamos ver o encanto e o mistério de viver uma história que é escrita à medida que é vivida, uma história que é tanto mais heróica quanto menos garantias temos do que vem à frente.
03 dezembro, 2005
A altura das grades
O presente se impõe como verdade.
Porém, algo estranho acontece. Caminho pelas silenciosas ruas de meu bairro e de repente me surpreendo com a altura das grades. Lembro subitamente de um esquecido tempo em que podíamos nos sentar na frente de nossas casas. As famílias colocavam as cadeiras nas calçadas e ficavam até tarde conversando sob a luz fraca dos postes nas quentes noites de verão. Não me lembro de grades naquele tempo. Muros, sim. Mas baixos. Não me lembro de medo. Esse tempo existiu realmente? Parece uma ilusão, o desgastado mito da idade de ouro. Mas, contra todas as evidências, minha memória resgata lembranças de uma prosaica utopia que acredito ter vivido.
As trevas não chegaram subitamente. Não houve um dia em que, por decreto, as pessoas se trancaram em suas casas. Não. O perigo foi entrando sorrateiramente em nossas vidas e, com a mesma naturalidade com que aceitamos o frio do inverno, acabamos nos acostumando com a idéia de ficar trancados dentro de nossas casas. As grades foram crescendo em volta de nós como o capim depois da chuva, silenciosamente. Hoje, contemplando o presente com a memória do passado, supreendo-me não apenas com a altura dessas pontiagudas estruturas de ferro, mas especialmente com o fato de que elas se tornaram apenas um dos muitos recursos para tentar manter distante a violência. Acima das grades, cercas eletrificadas. Nas casas, sofisticados sistemas de alarme. Nas calçadas, guaritas com vigilantes particulares. Nas ruas, carros das equipes de segurança privadas. Volto trinta anos no tempo e me dou conta de que não era nada assim. Como esperávamos que fosse o ano 2000? Como seria 2020? Estaria o mundo se preparando para uma nova era? Agora vivemos 2005, o presente nada mais é do que o futuro de outrora, e eu me constranjo em anunciar para os fantasmas do passado que não há boas novas: para crentes e descrentes, não são bênçãos que descem dos céus, mas o medo, que se precipita lentamente sobre nossas casas e vidas como o sereno de uma eterna madrugada.
Crianças e adolescentes crescem nesse cenário e devem pensar que sempre foi assim. Hoje, nós olhamos para as casas e nem reparamos nas grades que as separam das ruas; olhamos para as ruas e nem cogitamos da possibilidade de nos sentarmos nas calçadas, de caminharmos sob o manto das estrelas. O passado se transforma lentamente em ilusão, e a lembrança de outros tempos soa como uma espécie de senilidade.
Caminho sob a luz do sol nas silenciosas ruas de meu bairro. Vejo belas casas. Há jardins, alguns sabiás, raros carros passando. Mas eu me pergunto quanto mais as grades terão de crescer para percebermos que tomamos um caminho errado no passado. Não, não era esse o futuro com que sonhávamos!
06 novembro, 2005
Viver na China
Tenho informações de que, lá, os operários trabalham 12 horas por dia, sete dias por semana, folgando apenas nos feriados e recebendo salários entre 50 e 100 dólares mensais. A atividade sindical é proibida, e aqueles que ousam fazer as mais singelas reivindicações são condenados a vários anos de prisão. Um único partido governa o país, a imprensa e a internet são censuradas. O comunismo aliou-se ao capitalismo: do comunismo, permaneceu a ditadura opressora; o capitalismo da China, por sua vez, lembra aquele do início da Revolução Industrial. Por tudo isso, não deve nos surpreender que grandes empresas do mundo todo estejam se transferindo para a China: o custo da produção é muito mais baixo num país em que, por uns poucos dólares, trabalha-se de sol a sol todos os dias da semana e onde o progresso econômico permite agressões ao meio ambiente que não são mais toleradas na maior parte do planeta. Numa economia globalizada, o milagre econômico chinês faz evaporar postos de trabalho no Brasil e em muitos outros países onde o capitalismo precisa conviver com direitos trabalhistas e legislações ambientais. Tudo indica que vai demorar muito para os chineses conhecerem a democracia, pois os ventos da liberdade colocariam em risco o lucro fácil que o capital internacional busca na China.
Para além dos fatos e das opiniões, mantém-se minha curiosidade sobre a vida daqueles que vivem nesse cenário de transformações. Procurei, nos últimos dias, livros sobre a China e encontrei publicações de dois tipos: livros que louvam o milagre econômico chinês e arriscam apresentá-lo como modelo para outras nações (ai de nós!) e livros que apresentam relatos de viagem feitas dez ou vinte anos atrás, precocemente envelhecidos frente a tão aceleradas mudanças. Foi em blogs que consegui encontrar outros olhares sobre a China: é verdade que são visões de estrangeiros, mas pelo menos são olhares contemporâneos, críticos, de gente que está lá, respirando o ar do Oriente. Um repórter do jornal francês Liberation, Pierre Haski, mantém um interessante blog jornalístico sobre a China, Mon journal de Chine - finalista de um concurso da Deutsche Welle sobre os melhores blogs jornalísticos em várias línguas. Um olhar prosaico da vida de um estrangeiro em Pequim pode ser encontrado em China Life Blog, criação de um jovem professor norte-americano, Shawn Matthews, que está há poucos meses trabalhando em uma escola na capital chinesa e conta, com textos e muitas fotos, seu dia-a-dia naquela cidade. Também recomendo um passeio pelo China Blog List.com, site com links para blogs sobre a China. Ainda estou à procura de blogs escritos por chineses em alguma língua que eu possa entender.
Para além das barreiras lingüísticas e da minha preocupação com a perversa aliança chinesa entre comunismo e capitalismo, tenho de reconhecer que é fantástico o potencial dos blogs: se conseguimos separar o joio do trigo, podemos ter contato com uma riqueza de experiências e opiniões que há pouco tempo não iam além de um estreito círculo de relacionamentos e agora se abrem para o mundo. Seria bom poder acreditar que a multiplicação e descentralização dos canais de comunicação ajudarão as causas da liberdade e da igualdade, aqui ou na China. Porém, a história da humanidade parece nos dizer que é mais recomendável um ceticismo com pitadas de esperança do que um idealismo que nega a realidade. Boa noite, Brasil. Bom dia, China.